Delegado de SP pedirá para polícia do PR investigar farmacêutica que vendeu curso online de peeling de fenol a influencer Natalia Becker

 

O delegado que investiga a morte de um paciente após passar por um peeling de fenol em São Paulo disse nesta segunda-feira (10) que pedirá para a Polícia Civil do Paraná apurar se a farmacêutica Daniele Stuart, que vendeu curso online do procedimento a Natalia Becker, cometeu exercício ilegal da medicina.

Segundo Eduardo Luis Ferreira, delegado titular do 27º Distrito Policial (DP), Campo Belo, o Conselho Federal de Medicina (CFM) informou que somente médicos dermatologistas podem realizar esse tipo de peeling, por ser considerado invasivo.

"A gente vai extrair cópia do inquérito policial e enviar para a polícia do Paraná investigar a suspeita de que Daniele possa ter cometido exercício ilegal da medicina por ensinar como fazer peeling de fenol. Esse curso online extrapola a questão do ato médico. Está bem definido que esse tipo de procedimento é um ato médico", afirmou o delegado.

Apesar de a influencer Natalia se apresentar nas redes sociais como esteticista, ela não tem registro na Associação Nacional dos Esteticistas e Cosmetólogos (Anesco) para atuar na área.

Natalia é influencer e dona da clínica que aplicou o peeling de fenol no empresário Henrique Chagas, que morreu em 3 de junho cerca de duas horas após o procedimento. Ela foi indiciada por homicídio com dolo eventual, quando se assume o risco de matar, e responde ao crime em liberdade.

O Studio Natalia Becker foi fechado pela prefeitura após a morte do paciente por suspeita de irregularidades.

A Polícia Civil de São Paulo ainda aguarda o resultado do laudo que apontará a causa da morte do paciente. Mas a principal hipótese é a de que ele morreu em razão do fenol. Segundo peritos, Henrique teria inalado o produto, se asfixiado e tido uma parada cardiorrespiratória. Em entrevista exibida neste domingo pelo Fantástico, Natalia disse que a morte de Henrique "foi uma fatalidade".

Em seu interrogatório à polícia paulista, Natalia contou que aprendeu a aplicar o fenol após comprar no ano passado, por aproximadamente R$ 500, um curso virtual com Daniele Stuart, farmacêutica que atua em Curitiba, no Paraná.

Daniele é proprietária da Clínica Neo Stuart. Nas suas redes sociais, diz ser formada em biomedicina e se apresenta como doutora. Quem tem formação apenas em biomedicina, no entanto, não é médico.

Além de pedir que a polícia em Curitiba investigue Daniele, o delegado tenta ouvi-la no inquérito da delegacia de São Paulo, que apura as causas e eventuais responsabilidades pela morte de Henrique. Ainda não ficou definido se a farmacêutica dará depoimento na capital paulista ou no Paraná.

"Não temos essa informação. A polícia ainda não nos procurou", falou o advogado Jeffrey Chiquini, que defende os interesses de Daniele.

A farmacêutica foi procurada pelo g1, mas não quis comentar o assunto e pediu que sua defesa falasse.

"Tentar envolver a doutora Daniele nesse caso e relacioná-la à morte da vítima é de todo injusto e irresponsável e precipitado. Doutora Daniele é uma profissional respeitada, especialista na área, gabaritada. Que forneceu um curso de acesso livre conceitual, que já foi acessado por mais de 3 mil alunos, sem haver qualquer reclamação", afirmou o advogado.

E completou: "Acontece que a doutora Daniele não tem controle de quem acessa esse curso online. Mas afirmamos que em momento algum a doutora Daniele teve contato com essa pessoa que é acusada de autoria de homicídio. A doutora Daniele em momento algum ensinou essa senhora a realizar procedimentos invasivos. Não a instruiu a agir como fez. Inclusive os procedimentos que aquela senhora adotou não condizem com aquilo que a doutora Daniele ensina".

Segundo a defesa, sua cliente "não teve contato com a vítima". "E aquela que aplicou de forma errada tecnicamente o procedimento não era habilitada para tal", falou Jeffrey sobre Natalia. "A doutora Daniele é habilitada para atuar nessa área, habilitada para ensinar. Mas aquilo que a doutora Daniele ensina não foi aplicado como deveria."

Cerca de dez pessoas já foram ouvidas pelo 27º DP no inquérito que apura o caso do paciente morto após o peeling de fenol. Henrique tinha 27 anos e era dono de um pet shop em Pirassununga, interior de São Paulo, onde foi enterrado.

Há três anos, namorava o administrador Marcelo Camargo, de 49 anos, que mora em Campinas, também no interior do estado. Foi ele quem acompanhou o empresário ao procedimento na clínica em São Paulo e filmou com o celular o preparo para aplicação do fenol. O vídeo mostra o rosto do paciente cortado e sangrando após uma funcionária usar uma caneta com uma agulha na ponta.

Além desses vídeos, o Fantástico teve acesso à filmagem feita pelas câmeras de segurança do Studio Natalia Becker. Nas cenas, é possível ver quando Henrique passa mal.

Marcelo contou que o namorado teve uma reação súbita após se queixar das dores que estava sentindo assim que acabou o procedimento. "Ele apertou meu braço, arregalou o olho e... sufocado, disso ele já foi... e dali não tinha mais nada."

Henrique pagou R$ 5 mil pelo tratamento. O empresário se queixava de marcas de acne que adquiriu na adolescência.

Segundo os advogados que defendem os interesses do namorado de Henrique e da mãe do paciente morto, o procedimento de cortar o rosto para aplicar o produto não é adotado pelos especialistas que eles consultaram.

"Conversando com profissional da área, já verificamos que aqueles cortes no rosto não poderiam ter sido feitos para se aplicar um ácido fortíssimo como é o fenol", falou a advogada Elaine de Cassia Colicigno.

Procurada pela TV Globo, a Sociedade Brasileira de Dermatologia (SBD) informou, por meio de sua assessoria de imprensa, que não seria possível analisar o procedimento feito pela clínica de Natalia somente se baseando nos vídeos e nas fotos divulgados pela reportagem.

Natalia Becker é o nome fantasia de Natalia Fabiana de Freitas Antonio. Ela tem 29 anos e diz ainda possuir três clínicas com o nome Studio Natalia Becker: em São Paulo, no Rio de Janeiro e em Goiânia. Tem mais de 230 mil seguidores no Instagram.

Advogados citam asfixia

"Nossa convicção é que ele foi asfixiado de forma tóxica pelo uso do fenol. Esse produto, ao ser aplicado, veio a correr toda a via respiratória do Henrique. Além do cheiro, foi o fato, provavelmente, de como ela aplicou antes: riscou toda a face dele e passou esse produto", falou o advogado Adrian Piranga. "Tivemos essa informação através de uma fonte do IML [Instituto Médico Legal]. Porém, nós precisamos aguardar o laudo."

O fenol é um composto orgânico ácido que provoca uma reação inflamatória na pele. A inflamação causa descamação da superfície do tecido. O objetivo é reduzir manchas, rugas e cicatrizes, devolvendo a elasticidade da face.

Mas não foi isso o que ocorreu. Por esse motivo, a advogada Elaine falou que o escritório de advocacia que representa a mãe de Henrique irá entrar na Justiça com uma ação contra Natalia cobrando dela o pagamento de indenização por dano moral.

"A mãe do Henrique é uma pessoa extremamente simples, que dependia dele financeiramente, e a Natalia, ao fazer esse procedimento, assumiu o risco do resultado. Ela tem uma responsabilidade civil em cima disso", falou a advogada.


Via g1

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